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Entrevista a Ana Amaral, responsável pelo projeto vencedor da 9.ª edição do Prémio Rui Osório de Castro / Millennium bcp

Com um percurso marcado pela dedicação à investigação em sarcomas pediátricos, Ana Amaral lidera o projeto distinguido com o Prémio Rui Osório de Castro / Millennium bcp 2024. Nesta entrevista, a investigadora do Centro de Inovação em Biomedicina e Biotecnologia da Universidade de Coimbra fala-nos da sua motivação, do impacto esperado da sua investigação e dos desafios que se colocam à investigação em oncologia pediátrica em Portugal.

PIPOP – Pode partilhar connosco o seu percurso enquanto investigadora e o que a motivou a dedicar-se à área da oncologia pediátrica?

Ana Amaral – Curiosamente, desde pequena sempre tive imensa curiosidade. A minha mãe ofereceu-me um microscópio e eu gostava de preparar lâminas com uma gota de sangue, para tentar perceber se via diferenças entre o meu sangue e o da minha irmã. Por outro lado, assistir ao olhar perdido e impotente dos pais na ala da oncologia pediátrica, enquanto esperava por reuniões, foi também muito marcante. Não é um grupo do qual esperamos fazer parte. No fundo, sempre pensei em contribuir para um mundo melhor, e estou convencida de que a investigação em oncologia pediátrica é, sem dúvida, a minha forma de contribuir.

PIPOP – Qual é a pergunta de investigação que orienta o seu projeto e de que forma o trabalho pretende dar resposta a essa questão?

Ana Amaral – Dediquei os últimos 18 anos à investigação em sarcomas pediátricos, sempre com o objetivo de tentar desenvolver novas estratégias terapêuticas que possam oferecer melhores opções aos oncologistas e, consequentemente, aos pacientes e às suas famílias. O meu antigo chefe, o Dr. Enrique de Álava, referia-se sempre aos sarcomas como os “cancros esquecidos”, uma vez que, por serem menos frequentes e representarem um grupo de tumores muito complexo, muitas vezes eram pouco considerados pela indústria farmacêutica. Este facto motiva ainda mais a investigação dita académica.

Com a revolução que a imunoterapia trouxe ao campo da oncologia, e apesar de as características dos sarcomas serem particulares neste contexto, o nosso objetivo é entender se também aqui conseguimos entrar nesta nova era de terapias que tantas alegrias têm dado nos últimos anos.

PIPOP – Que impacto acredita que esta investigação pode ter no futuro da oncologia pediátrica e na vida das crianças e famílias?

Ana Amaral – Cada vez mais acho que temos de ser conscientes de que a investigação é o único caminho. A palavra cancro, por si só, assusta, mas graças a décadas de investigação clínica e pré-clínica, hoje em dia o panorama melhorou significativamente. A realidade é que “o cancro” representa, na verdade, centenas de doenças diferentes, com prognósticos distintos — e isso é o resultado do investimento e, principalmente, do esforço e da dedicação à investigação.

PIPOP – Na sua opinião, quais são os principais desafios e necessidades atuais da investigação em cancro pediátrico em Portugal?

Ana Amaral – Depois de 15 anos a trabalhar fora, regressei a Portugal, e do que consigo percecionar, o que falta é investimento e, por vezes, uma mudança de mentalidade. Tive a oportunidade de conhecer pessoas brilhantes, muito dedicadas, mas que não têm acesso aos equipamentos mais adequados, a colaborações que facilitam enormemente a otimização de protocolos, e muitas vezes nem a contratos de trabalho que lhes permitam começar e terminar uma ideia, concluir um projeto.

Os contratos dos investigadores são precários e gera-se uma ansiedade generalizada dentro da classe, que acaba por ser contraproducente. A investigação não é lenta por opção ou por preguiça, mas sim porque requer rigor e validação — e isso não é compatível com dois ou três anos de trabalho. Envolve muito tempo e muita gente, é um verdadeiro trabalho em grupo.

Lamentavelmente, perdemos muito por isso. Não faltam ideias, não faltam boas ideias — falta, sim, valorização da carreira.

PIPOP – Como descreveria a importância do Prémio Rui Osório de Castro / Millennium bcp para o desenvolvimento do seu projeto e para a valorização da investigação nesta área?

Ana Amaral – Foi com imensa alegria que recebi a notícia. Este é o primeiro projeto que consigo obter como investigadora desde que regressei a Portugal, e sentir que a Fundação apoia esta ideia e está investida em promover investigação numa doença tão rara e tão característica foi, realmente, uma enorme satisfação.

Espero que, no âmbito deste projeto, consigamos gerar resultados significativos para continuar a apostar na introdução da imunoterapia em sarcomas.

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